segunda-feira, 8 de outubro de 2012

DO AMOR E OUTROS DEMÔNIOS - GABRIEL GARCÍA MÁRQUEZ



   Com  toda essa febre da "brilhante" trilogia dos "Cinquenta tons de cinza" de alguma escritora recalcada e mal-comida que escreveu esses livros para vender, trago para meus adorados leitores (e principalmente leitoras) um livro decente. Um romance decente! Não é água com açúcar, mas fala de amor. O incrível escritor colombiano conhecido pelo catatau "Cem anos de solidão" se utiliza do mágico novamente nesta obra denominada "Do amor e outros demônios". 
   Ele, como jornalista, é incumbido de visitar no Caribe um velho convento que seria destruído e, em cima dele, feito um hotel cinco estrelas. Lá encontra uma cripta de uma marquesinha cujos cabelos cobreados eram simplesmente enormes e mais pareciam a cauda de um vestido. No mesmo tempo, lembra uma história contada pela avó. Uma filha de marquês é mordida por um cachorro raivoso e contrai hidrofobia, o pai tenta levá-la para todos os tipos de boticários, curandeiros, bruxos e benzedores. Nada funciona. Então a menina é internada justamente num convento. O padre diretor da biblioteca da província, mesmo sem saber é obrigado pelo bispo a exorcizar a menina, pois a Igreja acredita que um demônio a habita. O que acontece? O Padre acaba se apaixonando pela criança. Leva-lhe doces e meios de conforto na imunda cela que ela fica. 
   O enredo é diferenciado. Não tem o sexo dos "tons de cinza", mas tem um ar erótico e cheio de mistérios; um velho clichê dos povos dos trópicos, eu sei. Mas "Gabo" consegue fazer o clichê se tornar algo novo, simplesmente renovado. Um brilho diferente. Um brilho literário que nossos digníssimos Mário e Oswald de Andrade não chegaram nem perto. Talvez porque escreveram romances "Experimentais" - muito diferente do Márquez que tinha um romance sério e complexo, geralmente envolvendo muitas personagens com longo perfil psicológico e o ambiente intervém de forma única. Você, caro leitor, parece sentir o bafo do mar e o calor lambendo seu rosto; isso é muito poético, literário e difícil de se achar num escritor atual. Por quê? Porque literatura hoje é comércio (no exterior, claro. No Brasil, não precisamos nos preocupar com isso. Afinal poucos leem.) e comércio é linha de montagem, e linha de montagem é escrever qualquer coisa de forma mecânica e com o mínimo de sentimento possível para terminar logo e imprimir. 
   Fazia tempo que não lia uma história que tivesse um final "inesperado" - típico dos livretos de suspense, estilo Agatha Christie. Você precisa chegar na última página para saber o desfecho... isso é brilhante. Porque na maioria dos livros literários isso não existe. Enfim, um Nobel merecido. É Gabo, Camus, Szymborska (outra hora, falarei sobre ela) e Samuel Becket. 
   A edição da Record que li é muito agradável (finalmente um livro com páginas cor branca, odeio creme!), letras grandes e papel encorpado dando aparência de ser um livro grande, todavia não o é. Só é grande conotativamente falando, isso é. Não pode faltar na estante da sala para acompanhar a Barsa, todos os volumes pegando poeira juntos, não?